Flora do Cerrado ganha novo exemplar
Foi por um acaso que a pedagoga Marina Rezende, curadora do Herbário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em Brasília, contribuiu de forma decisiva para aumentar o cadastro de espécies da flora do Cerrado. Por ter sido a primeira pessoa a coletar no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (PNCV), em Alto Paraíso de Goiás, uma herbácea até então desconhecida da família das Eriocaulaceae, o popular chuveirinho, teve seu sobrenome inscrito no batismo da espécie que passou a se chamar Paepalanthus fonsecae. "Ela mal nasceu e corre o risco de desaparecer", disse ela ao POPULAR .
Tudo começou em 2018 quando o Herbário IBGE recebeu profissionais do Jardim Botânico do Rio de Janeiro para um curso de identificação botânica. Para as aulas de campo, o grupo seguiu para a região do PNCV, onde foram coletadas várias espécies. "Não sou especialista. Estávamos num lugar arenoso e tinha muitas dessas herbáceas. Fui coletando o que tinha pela frente", contou. O material foi levado para Brasília e analisado por um dos mais importantes especialistas em Eriocaulaceae, o biólogo e doutor em Botânica Marcelo Trovó Lopes de Oliveira.
Após anos de estudos e análises, o professor e pesquisador do Departamento de Botânica do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) comprovou o ineditismo da espécie. No início do mês, sua equipe publicou artigo científico no periódico científico Nordic Journal of Botany sobre a descoberta. "Paepalanthus fonsecae é conhecida de duas coleções do Brasil central nos municípios de Alto Paraíso de Goiás e Cavalcante e, de acordo com o critério B da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), deve ser tratada como criticamente ameaçada (CR)", escrevem os pesquisadores no artigo.
Marina é uma pedagoga de formação apaixonada por botânica. Há 45 anos é servidora do IBGE, 20 deles na curadoria do herbário da instituição na capital federal. "Eu fiquei surpresa com a homenagem, mas ao mesmo tempo muito honrada. Receber uma homenagem de um pesquisador do nível de Marcelo Trovó é muito bom, para mim, para a instituição e para o herbário", afirmou. Um exemplar da Paepalanthus fonsecae foi incorporado ao Herbário IBGE e outras três amostras foram enviadas a herbários de Goiás, do Rio de Janeiro e de São Paulo.
Em artigo para o site do WWF Brasil, Marcelo Trovó e Takeo Sano, do Departamento de Botânica da Universidade de São Paulo (USP), explicam que o Brasil possui, oficialmente, quase 800 espécies de chuveirinho ou sombreiro, como também é conhecida a espécie que pertence à família das sempre-vivas. Elas estão distribuídas principalmente em unidades de conservação e áreas preservadas do Cerrado, mas também podem ser encontradas na Caatinga e na Mata Atlântica. Fogo, garimpo, mineração, expansão da agricultura e da pecuária e, em alguns casos - como no Jalapão - o extrativismo descontrolado são grandes ameaças às sempre-vivas. O capim-dourado faz parte da família.
"Estimativas oficiais apontam que uma em cada cinco espécies exclusivas do Cerrado já não sobrevivem em unidades de conservação. Das 472 espécies na lista da flora brasileira ameaçada de extinção, 132 (28%) estão no bioma", afirmam os pesquisadores. O Paepalanthus chiquitensis Herzog é a espécie mais representativa do grupo de chuveirinhos e conta com grande população no PNCV. "No período reprodutivo, a espécie deixa de ter o aspecto semelhante ao de uma bromélia e emite um eixo alongado com cerca de 2 metros. No ápice deste eixo, surge uma vistosa inflorescência que se destaca na paisagem." Por enquanto, o Paepalanthus fonsecae, só foi encontrado dentro do PNCV e no município de Cavalcante.
87 mil espécies catalogadas
O IBGE possui dois herbários: a unidade localizada em Brasília, na Reserva Ecológica do IBGE (Recor), conhecida pelo nome Herbário IBGE, com mais de 87 mil espécies catalogadas, e a unidade de Salvador, situada no Jardim Botânico da capital baiana, conhecida como Herbário RadamBrasil.
As visitas presenciais ao Herbário IBGE de Brasília podem ser realizadas de segunda a quinta-feira, mediante agendamento. Para marcar, o contato é o e-mail herbarioibge.df@ibge.gov.br.